Cara a Cara: Marina Sampaio
A música toca, o público aplaude e as meninas se movimentam em acrobacias inimagináveis enquanto conquistam com folga o Campeonato Sul-Americano de Ginástica Rítmica. Dentre elas, uma se destaca: Marina Ramos Sampaio. Hoje com 14 anos, a jovem ginasta possui um score invejável de vitórias em campeonatos nacionais e internacionais. Natural da cidade de Jundiaí, no interior de São Paulo, Marina conta para a WHIZ como o esporte a levou até ao Campeonato Sul-Americano na Colômbia, em 2016 e no Equador, em 2017.
Dona de uma personalidade esperta e vivaz, Nina, como é chamada pelos amigos, lembra que o nascimento do irmão foi o estopim para entrar na ginástica rítmica. “Comecei quando tinha oito anos e foi porque meu irmão tinha acabado de nascer e eu ficava muito grudada nele. Então, minha mãe falou que me poria no esporte pra eu sair de cima dele”, diz. Logo, os treinos da escolinha, oferecidos pelo CECE – Complexos Educacionais, Culturais e Esportivo – não eram mais suficientes. “Eu ficava pedindo para a professora me ensinar mais coisas, então ela me mandou para a equipe de competição de Jundiaí. Não havia um lugar fixo, a gente treinava em vários lugares, dependendo do dia da semana”, os treinos a levaram a competir nesse mesmo ano, embora só começasse a alimentar seu estoque de medalhas um ano depois, quando ganhou o segundo lugar na Copa São Paulo na modalidade individual de corda.
Marina também competia na modalidade conjuntos e depois de dois anos treinando em Jundiaí foi fazer um teste para a equipe de Campinas, de onde eram suas técnicas. “Eu passei no teste, só que eu não fui treinar. Eu parei de fazer ginástica por um ano e comecei a dançar.”, seu grupo até chegou a ganhar o segundo lugar na competição de Joinville, um dos maiores festivais de dança do mundo. “No final desse ano, eu já tinha ganhado figurino, uma dança em dupla, o que é raro de conseguir. Então, minha técnica de Campinas me liga e fala ‘Preciso da Marina para o Sul-Americano. Tudo pago, ela vem de graça’. Aí eu falei ‘Ué, eu vou, né!’. Foi um ano bem difícil pra gente financeiramente, eu não pagava para dançar, mas cada figurino era uns 500 e poucos reais e eu dançava cinco coreografias, eu não tinha dinheiro para pagar tudo isso. Em Campinas eu não pagava nada e ainda viajava para fora”, Nina revela.
Marina voltou a treinar ginástica e naquele ano e ela e seu grupo ganharam todos os campeonatos que competiram no ano de 2016, o Campeonato Paulista e o Estadual. “Então fomos para a Copa Brasil, que era a seletiva para o Sul-Americano. Foi a competição mais tensa que já fui na minha vida. Nosso grupo nunca tinha ido para o Sul-Americano e era só o primeiro lugar que ia. Era muita pressão. Tudo precisava ser perfeito”, Nina relembra. Elas não apenas ganharam a Copa, como também venceram todas as modalidades no Sul-Americano, mas não sem um treino intenso e especial, com direito à preparação para performances em altas altitudes, já que a cidade de Paipa, cidade-sede na Colômbia, está a 2.500 metros do nível do mar.
Marina revela que quase não foi para o Sul-Americano de 2017, no Equador, por causa da idade e sua ida só foi possível porque pouco antes da competição foi aberta uma nova categoria de 12 a 14 anos. “Ganhamos do Chile, Argentina, todos eles. Nas duas competições achei que a gente tava bem a frente. A gente tirava 12 e elas 8. As competições brasileiras foram mil vezes mais difíceis que o Sul-Americano”, analisa. Porém, se a competição em si não foi tão difícil, não se pode dizer o mesmo da situação financeira. Em outubro de 2017, o patrocínio do clube pelo qual competiam foi cortado. “Teve uma vez que a gente teve que pagar o collant e era um valor alto, então precisamos fazer rifas e vender alguns itens para conseguir viajar”, a situação ficou tão complicada que Marina precisou desistir de treinar no clube em Campinas.
Durante um tempo, a jovem ainda tentou a ginástica artística e de trampolim, mas hoje treina só de vez em quando e participa de um grupo de cheerleaders. Marina reflete sobre a falta de incentivo que o esporte recebe no Brasil: “O incentivo em Jundiaí era limitado, pois o foco da cidade são competições regionais, como os Jogos Abertos do interior, existe um trabalho muito bom nas escolinhas, pois a intenção é tornar o esporte acessível a todos. Quem quer competir em competições maiores precisa ir para outras cidades. Em Campinas, o clube tem uma grande tradição no esporte, conta com patrocinadores e tem incentivos da prefeitura. Pra mim foi uma conquista conseguir treinar lá, pois chequei a integrar a Seleção Infantil e Pré Junior Brasileira e isso foi incrível. Onde a Seleção Brasileira permanente treina é em Aracaju, depois que se consegue entrar os incentivos são melhores, pois o esporte ganha mais visibilidade. Eu tinha a possibilidade de ser chamada para treinar lá, só que eu tinha doze anos e teria que morar sozinha”, Marina relembra e expressa o desejo de voltar a treinar e competir.
Quando perguntada sobre as principais dificuldades da carreira, Nina cita três que lhe marcaram. “A coisa mais difícil era ter que emagrecer. Eu perdia três quilos antes de cada competição. A exigência para se manter magra e leve é bem grande, porque é um esporte estético e que necessita de exatidão. Na quadra cada série era de dois minutos e meio de coreografia, mas nos treinos repetíamos infinitas vezes até chegar a perfeição. A cobrança pela magreza é também para reduzir riscos de lesões. A competitividade era algo difícil também e é algo muito presente no esporte, porque todas treinam muito, e anseiam por uma oportunidade. No meu caso, tive dificuldade de adaptação no início, porque o conjunto era formado por meninas que cresceram juntas e treinavam assim desde muito novas. Chegar com uma equipe já formada e ter que conquistar o seu lugar leva tempo e exige muito jogo de cintura. Outro ponto era conciliar a escola com as rotinas de treinos, já que viajava todos os dias para Campinas. A escola terminava às 12h20, e eu entrava no ginásio as 14:00. Só chegava em casa às 19h30, quando conseguia cuidar das coisas da escola. Mas como amo muito estudar e por ser aluna bolsista sempre tive o foco em ser a melhor aluna que poderia ser. Minha bolsa de estudo veio através do esporte e é com certeza uma de minhas maiores conquistas”.
Marina tem o sonho de voltar a treinar, mas a ginástica não é o único de seus projetos. Ela dedica-se muito aos estudos e tem o desejo de estudar medicina no exterior e trabalhar com os Médicos Sem Fronteiras. Recentemente, foi em alguns hospitais cantar, como projeto voluntário. Ainda muito jovem, Nina já tem um passado de sucessos e toda uma vida de sonhos pela frente.