O podcast nas terras brasileiras
No decorrer dos anos, esse meio se tornou uma importante forma de transmitir informação e entretenimento
Segundo a Podcast Stats Soundbites, o consumo de podcast cresceu, de janeiro de 2018 a novembro de 2019, mais de 20% no país a cada mês. Os dados elevados colocam o Brasil como a segunda nação no mundo que mais consome essa mídia, atrás apenas dos Estados Unidos. Mas, apesar de ter presenciado uma alta em sua popularidade nesses últimos anos, o podcast já tem uma longa trajetória desde a sua invenção.
O podcast no Brasil
Criado no início de 2004 pelo radialista e ex-VJ da MTV Adam Cury, em parceria com o empresário David Winter, o podcast surge com a proposta de utilizar a linguagem de rádio em áudios que pudessem ser compartilhados em sites e baixados para serem ouvidos inicialmente nos aparelhos da Apple. O termo surge, aliás, pela junção das palavras broadcast e iPod, o principal media player dessa empresa. No Brasil, a mídia começou a ser produzida ainda em 2004. Segundo Marcelo Abud, professor universitário, radialista e criador do podcast Peças Raras, o Digital Minds, idealizado por Danilo Medeiros, ficou registrado como o ponto inicial no país. “O Dia do Podcast, no Brasil, é comemorado em 21 de outubro, porque foi nessa data, em 2004, que Danilo colocou no ar o primeiro episódio do Digital Minds”, comenta. “Um ano depois, em outubro de 2005, a Volkswagen, com o Super Surf, e os Canais Sony, com o Sonycast, inauguraram no país a onda de podcasts corporativos”, complementa o professor.
Os marcos da mídia no país
Fundado por Alexandre Ottoni e Deive Pazos, do grupo Jovem Nerd, o Nerdcast surgiu em 2006 e revolucionou a mídia no país. Com temas que passam por ciências, história, cultura pop e cotidiano, foi o primeiro podcast brasileiro a atingir a marca de 1 bilhão de downloads e o terceiro no mundo, atrás apenas do Stuff You Should Know e o The Daily, do The New York Times. Segundo Abud, o Nerdcast iniciou um modelo que se tornaria referência no país: “Em 2006, eles propõem um áudio semanal de mais de uma hora de duração. Em um período em que banda larga era ficção e que se dizia que os jovens não tinham paciência para conteúdos mais aprofundados, poucos acreditariam no êxito do meio. Não apenas deu certo, como é uma referência”, explica.
Nos próximos anos, a mídia se tornou mais popular e cada vez mais ninchada. Além disso, surgem podcasts que investem em storytelling, que contam histórias fictícias, reais e que remetem às antigas radionovelas.
Uma nova ferramenta para o jornalismo
Tradicionais veículos de comunicação criaram seus próprios podcasts com o intuito de realizar o trabalho jornalístico com o auxílio dessa mídia. Para Paula Scarpin, jornalista e idealizadora da Rádio Novelo, veículos como a Folha, o Nexo, o Globo e o Estadão adotaram um modelo que fortalecem a marca com os seus próprios podcasts, além de ser uma possibilidade para produzirem conteúdo de maneira mais barata. “Para além das empresas jornalísticas, pensando nos repórteres, o podcast pode ser um meio relativamente barato de produzir conteúdo de maneira autônoma e criar portfólio, público – e, em alguns casos, anunciantes, parceiros comerciais ou serem sustentados com financiamento coletivo da audiência”, comenta a jornalista.
O “Vozes – Histórias e Reflexões”, da CBN, é um exemplo do podcast à serviço do jornalismo. Gabriela Viana, jornalista e apresentadora do Vozes, explica que o programa foi criado em um período de uma já existente polarização política e é uma tentativa da CBN de aprofundar assuntos de importância social. “O Vozes surge no período eleitoral em 2018 e vem da necessidade de ter um conteúdo mais aprofundado em questões sociais e comportamentos humanos. A ideia principal era focar nas experiências das pessoas e a partir disso, discutir o mundo e a sociedade”, comenta.
A crescente popularidade
Nos últimos anos, o podcast teve sua popularidade ainda mais intensificada no Brasil. Segundo a Associação Brasileira de Podcasters (ABPod), há mais de dois mil existentes no país. Para Marcelo Abud, dois principais fatores são muito responsáveis por essas estatísticas: “Em termos mundiais, o Google e o Spotify são os disseminadores da ideia do podcast, investindo em concursos e conteúdos próprios, mas o alcance da mídia por aqui cresce muito quando o Grupo Globo começa a produzir os seus próprios conteúdos e, para atingir um público mais adulto, faz matérias no Fantástico e no Jornal Nacional explicando ao público o que é esse tal de podcast. Missão não muito fácil, para quem não é jovem e apaixonado pela Apple”.
Mas além da grande exposição midiática que o meio passou a ter no país, Paula Scarpin explica que o podcast é muito democrático, acessível e que permite espaço a novos produtores de conteúdos, além de ser um meio extremamente relacionado à atualidade, o que ajuda a aumentar ainda mais sua popularidade. “Acredito que o podcast é perfeitamente talhado para a ‘vida moderna’, ‘multi-funções’ em que se anseia por conteúdo o tempo todo. Como todo mundo já anda com celular no bolso, é a forma perfeita de consumo de conteúdo no transporte, na academia, nas tarefas domésticas, porque não ocupa nem as mãos nem os olhos”, exemplifica.
O futuro da mídia
Atualmente, o podcast cresce ainda mais no Brasil e se torna até mesmo um espaço para a publicidade. Essa alta popularidade, segundo Scarpin, ajudará a manter o futuro do meio: “Acredito fortemente que a popularização deve contribuir para a sustentabilidade financeira do meio para quem quer produzir podcasts profissionalmente. Mas muito do meu otimismo e paixão pela mídia tem a ver com a facilidade de se produzir e distribuir conteúdo, o que faz dele um meio muito democrático e perfeito para literalmente dar voz a grupos que não se viam representados na mídia tradicional. E este caráter não deve se perder”. Para Gabriela, a mídia ainda pode alcançar inúmeros espaços nesses próximos anos: “Acho que o podcast tem tudo pra continuar crescendo. Todos os dias vemos novos programas surgindo e ainda há uma infinidade de nichos para serem preenchidos. Mas também é sempre importante lembrar que é preciso planejar o programa, saber a que veio e, sobretudo, para quem vai”.