Um olhar inocente

São 17:45 de uma tarde típica da primavera, ainda não é noite, mas já não se pode mais ver o sol. Sentada em um banco de madeira no parque, tenho a visão de um carrinho de sorvete e observo uma família escolhendo sabores. Dois palitos de coco e um de chocolate.

A mãe entrega os sorvetes para duas meninas pequenas. Ao se sentarem para apreciar o doce, a maiorzinha, aparentando oito ou nove anos, parecia quase ter decorado os gestos da mãe, a mesma postura, com as pernas cruzadas da mesma forma. Enquanto a menor, de três ou quatro anos, ainda se atrapalha tentando comer e olhar para a mãe ao mesmo tempo.

Logo após terem se acomodado, surge um novo personagem na cena. Um garoto, um pouco sujo e com as roupas rasgadas, parou em uma lixeira próxima ao carrinho. O menino retirava algumas latinhas do lixo, quando parou e se sentou em um banco ao lado. Mãe e filha continuaram conversando entre si, apenas a filha menor parecia reparar a presença do estranho. A pequena se virou, o encarou por um minuto e deu um sorriso largo com o boca suja de chocolate. O menino se espantou com o gesto, como se esperasse outra reação, mas retribuiu o sorriso, antes de se levantar e sair. 

Me perguntei quanto tempo aquela menininha levaria para deixar de enxergar o garoto, assim como faziam seus exemplos maiores.