Procura-se um casamento

Já ouvimos falar – e talvez até experimentado – daquela pressão familiar por netinhos e casamento. Mas te garanto, na China é muito pior. Uma série de guarda-chuvas coloridos enfileiram-se de ambos os lados do caminho que corta a Praça do Povo, em Xanghai. Uma visão até bonita, mas eles não estão ali para decoração. Dia após dia, pais e avós aglomeram-se com um único objetivo: conseguir um casamento para seus filhos. Esse é o famoso Mercado de Casamentos, onde os adultos solteiros são anunciados em folhas de papel, muitas vezes escritas à mão, penduradas em guarda-chuvas, paredes, varais, ou qualquer lugar disponível na praça.

Os pais circulam com caderninhos anotando informações dos perfis que lhes agradam e são bem criteriosos em suas exigências. Se os homens não tiverem uma casa própria, um carro e salário respeitável, não têm qualquer chance. Já para as mulheres a principal exigência é que tenham idade menor do que 27 anos. “Sheng nu” é o termo pejorativo dado às mulheres que não se casaram antes dessa idade. Em tradução livre significa “mulheres que sobraram”.

Foto: Gillian Bolsover

Aos olhos ocidentais, a prática pode parecer estranha e recebe várias interpretações desfavoráveis, até mesmo dos jovens chineses. O curioso é que a maioria deles nem sabe que está sendo anunciada. Em parte, esse fenômeno é consequência da lei do filho único. Na cultura chinesa, um filho homem que perpetue o nome da família é muito importante e por isso era prática comum abortar as meninas. Isso causou um enorme déficit na quantidade de homens e mulheres no país. Então, casar seu único descendente é uma questão de honra.

Nos últimos anos, temos visto o crescimento do movimento pelo empoderamento feminino no mundo, e não foi diferente na China. Um mini-documentário, produzido por uma marca de produtos de beleza chamada SK-II, viralizou em 2016 ao destacar a beleza e independência das mulheres que sofrem com o estigma de “sheng nu”. Muitas delas são pessoas que escolheram dedicar-se à carreira e deixaram o casamento para segundo plano, mas não levam o crédito por sua formação. O documentário joga luz sobre a pressão que elas sofrem e reflete a luta delas por aceitação, principalmente dos pais. Uma frase comum que aparece é “me sinto uma forasteira”.

Outra dessas “mulheres que sobraram” é Guo Yingguang, uma fotógrafa que usou o Mercado de Casamentos como tema do doutorado. Em uma experiência, ela fez um perfil de si mesma, sem mencionar sua idade e o levou à praça para filmar escondida a reação das pessoas. Não importava as informações que ela apresentava, a primeira coisa que elas perguntavam era a idade dela. Várias vezes criticaram seu nível de formação, e um chegou a dizer que “não era bom uma mulher estudar demais”. Seu vídeo também ganhou grande repercussão, e foi mais uma voz de denúncia contra a discriminação sofrida pelas “sheng nu”.

Para ver o vídeo de Guo e o mini-documentário, acesse:

Foto: Reprodução

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