Cara a Cara: Aretha Duarte, a primeira latino-americana negra a chegar ao topo do Everest

Imagem: Gabriel Tarso

De catadora de recicláveis ao cume da maior montanha do planeta

No dia 23 de maio de 2021, às 10h24 pelo horário nepalês, Aretha Duarte, de 37 anos, enfrentou os 8.848 metros até o topo do Monte Everest. A montanhista fez história e, após tantos esforços, tornou seu sonho uma realidade.
Nascida na periferia de Campinas, ela encontrou o trabalho com reciclagem como forma de custeio para sua viagem, o que foi em torno de 40% de todo valor, juntamente às empresas patrocinadas e até mesmo sua participação em um quadro no “Caldeirão do Hulk”.

WHIZ: Após toda sua trajetória e lutas percorridas, quais sentimentos te tocaram ao chegar no cume do Everest?

Aretha: Como montanhista, minha sensação de chegar ao cume do Everest foi de “caraca, subi de nível”. Quão difícil é escalar essa montanha. É difícil expressar tudo que senti, pois a emoção é forte. Mas pensei sobre a minha realização e o quanto ela pode servir de inspiração para as pessoas, fazendo com que elas entendam o seu poder. E se elas conseguirem pensar, imaginar, sonhar, se tudo aquilo fizer sentido para elas, terão a condição de realizar. É isso que eu acredito.

WHIZ: Como você enxerga a Aretha de hoje, depois de todo percurso até chegar ao topo do Everest?

Aretha: Eu voltei mais forte e determinada a trabalhar por mudanças sociais e por um futuro melhor. E também voltei diferente no sentido de refletir quantas coisas eu ainda posso melhorar pessoalmente, como empatia, respeito e comunicação não violenta. Além de entender a história dos outros, mesmo quando diferentes, sem julgamento.
Todo mundo tem algo positivo a entregar para a sociedade e entendi que preciso melhorar para que essa vida na cidade seja tão especial quanto na montanha. Acredito que toda essa experiência me faz uma pessoa diferente, no sentido de me sentir ainda mais privilegiada.
O Everest é uma vivência rara e incomum. A cada dia de ascensão, eu ficava mais surpresa e feliz no sentido de pensar: “Poxa, como pode essa montanha ser tão maravilhosa”. Nunca poderia imaginar o que eu estava vendo ao vivo. Me sentia ainda mais grata por viver aquela situação e entender o quão difícil e especial era estar ali.

WHIZ: Após toda sua experiência com o montanhismo, o que te motiva?

Aretha: Na montanha, você não sabe direito sua motivação, pois você vai passo a passo. No Everest, você chega no campo de base e depois segue subindo, até atacar o cume. O que me motiva é o próximo passo. Quero ajudar a fazer uma transformação socioambiental, a fim de garantir dignidade e qualidade na vida das pessoas. Nesse primeiro momento, especialmente para as mulheres negras, pois elas precisam saber disso.
Elas não precisam ficar focadas só no sonho grande, mas no próximo passo e, depois, no passo seguinte, com constância e regularidade até chegar ao grande objetivo. Todas as mulheres podem.

WHIZ: Qual próximo desafio você pretende enfrentar?

Aretha: Do ponto de vista de montanha, ainda não pensei em nada, estou digerindo todo esse projeto do Everest, que foi uma conquista fantástica.
Tenho novas metas na cabeça, como dar andamento na construção da minha casa. O objetivo é oferecer um pouco de conforto para a minha mãe, pois quando decidi escalar o Everest a casa ficou paralisada, em meio a dois grandes projetos para minha condição financeira. Eu entendia que seria uma pausa, e agora vou retomar.
Minha escalada não era uma realização pessoal, muito pelo contrário, sempre entendi que geraria resultados coletivos, e a busca por uma sociedade melhor se tornou minha prioridade desde o momento em que decidi pela expedição rumo ao Everest.
Vou dar andamento aos projetos sociais. Existe uma campanha para arrecadar resíduos de metais para construir um centro de treino de escalada na periferia. Quem sabe a gente não dá sorte de encontrar um talento que possa nos representar na Olimpíada? Porém, o mais importante é ajudar a dar uma vida digna e justa para que as pessoas entendam a capacidade de se desenvolver. E um centro de escalada pode ajudar nesse processo.

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