E você? Para onde vai hoje?

Como já é rotineiro, vejo o vendedor ambulante do trem, que vai e vem entre os vagões, tentando atrair alguma clientela para vender sua mercadoria, a qual nem me parece ser possível ter algum lucro pelo preço vendido. Fugitivo dos guardas das estações e dos olhares de desprezo daqueles que só vêem sua pessoa como um estorvo pra sociedade, mas ao mesmo tempo, encarando a realidade do pagamento mensal e da necessidade da comida na mesa dia após dia.

De vagão em vagão,ele tenta chamar a atenção:

– Um por cinco e dois é dez mas se me chamar agora, leva outro de brinde pra casa.

E assim seguimos, por mais de duas horas, desde a estação Estudantes até a Luz e depois o inverso, de terminal a terminal, seja pelo trem expresso ou tendo que fazer baldeações, chovendo ou não. Sua presença é notória como a de um empregado que bate o cartão diariamente, porém, este sempre andarilhando pelas linhas subterrâneas e sem chegar a nenhum destino. Seja pelo presidente atual ou o anterior ou até talvez pelo presidente anterior ao anterior, percebo com o passar do tempo que aquele vendedor está nessa longa viagem há anos e me pergunto até quando estará nessa situação sem nunca ser promovido a um lugar devido que ele possa tirar seu ganha pão.

Sempre procura um espacinho, por menor que seja, para passar e divulgar suas promoções. Situação que incomoda muitos passageiros, ainda mais em horários de pico que buscam o mínimo de conforto dentre tantas pessoas e muito tempo de viagem. Incômodo semelhante a preocupação de não ter a segurança de poder receber um salário mínimo?

É ignorado e se torna invisível, porém se torna visível porque incomoda. Contudo nada é feito diante desse cotidiano para que o conforto deixe de ser um privilégio para poucos, enquanto outros se tornam fugitivos para sobreviver ao dia a dia.

A única imagem que eu e outros passageiros temos é de um homem que é removido à força daquilo que o sustenta. O assalariado, confundido com outros que se aproveitam do tumulto para tirar vantagem da ilegalidade. Uma passagem ganha para cadeia, sem volta marcada.