Pelo menos eu não era adulta

Querer desaparecer no meio do abismo da imaginação de uma criança. Era o que eu fazia todos os dias quando eu tinha 12 anos. Conversar com plantas e insetos, achar que – de alguma maneira – eu era o “um em um milhão” que todos os adultos conversavam. Caçar borboletas, escrever no meu caderno de capa verde relatórios imaginários sobre como minhas aventuras com fadas e duendes eram bem mais interessantes que as equações de matemática. Todos os dias eu criava um novo universo. A realidade para mim era muito entediante e, de qualquer maneira, eu nunca senti que eu realmente pertencesse à ela.

“Eu vou caminhar em volta do lago, tudo bem, pai?”, essa era mais uma afirmação do que uma pergunta. Eu amava caminhar em volta do lago – que para uma criança de 10 anos parecia um oceano infinito – desse restaurante que eu e meus irmãos íamos pelo menos uma vez por mês. Acredito que ficar olhando para água, vendo meu reflexo, rodeada de árvores e completamente sozinha era o que me mantinha sana entre uma reclamação do meu pai e uma ligação dele brigando com a minha mãe. Ninguém era perfeito, apesar de quererem parecer.

Em uma dessas aventuras em volta do lago, notei uma placa presa a uma árvore com a palavra “PROIBIDO” encravada em letras grandes e vermelhas. Por alguns meses, eu apenas olhava para a placa e nunca adentrava a mata que após ela se escondia. Em um dos finais de semana, no meio do choro do meu irmão mais novo e do desapontamento do meu pai com qualquer que seja o motivo, eu corri para o lago e fiquei caminhando. Eu não era muito de chorar, ou tentar “brigar” com adultos, então só me mantive quieta e fui para o lugar que sempre me manteve segura de reclamações, brigas e choros. E dessa vez adentrei o caminho após a placa “PROIBIDO”.

Quando lembro desse dia, fico pensando que qualquer coisa podia ter acontecido comigo. Eu lembro da sensação de saber que nada de ruim ia acontecer e de sentir minha intuição gritando para eu adentrar aquela pequena floresta, mas realmente nunca contei para ninguém que fiz isso, mesmo naquele dia. Quando caminhei por alguns segundos dentro da mata, comecei a ouvir o barulho de água correndo. As plantas em minha volta estavam úmidas e tinham essa cor verde vibrante, como se nunca tivessem sido tocadas – nem mesmo por um olhar. E logo depois, avistei uma das coisas mais belas da natureza: uma cachoeira.

Do lado da cachoeira tinha essa rocha enorme que batia na altura da minha cintura. Ela era coberta de musgos e estava completamente molhada. Eu não parava de sorrir. Fiquei lá por apenas alguns minutos – período em que pensei que ninguém iria realmente acreditar em mim se eu contasse, pensei que queria ficar naquele mini-paraíso por bem mais do que minutos, também lembro de acreditar que talvez eu era uma sereia e achar aquela cachoeira era o sinal do meu destino. No final acredito que era apenas o universo tentando me mostrar que adultos são irritantes, que eu ia conseguir me virar e que nem tudo era tão ruim quanto parecia ser.

Voltei para a mesa, meu irmão tinha parado de chorar, meu pai não tinha percebido que eu tinha saído, minha irmã pintava um desenho qualquer e eu – depois de contemplar o que eu chamo até hoje de “um dos meus despertares” – criei coragem para confessar a mim mesma que: eu não era uma sereia – mas pelo menos eu não era adulta.

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