Animais únicos, relações exóticas

Saiba mais sobre a criação de animais exóticos e silvestres na cidade

O brasileiro está mais que acostumado com a companhia dos animais de estimação. É difícil encontrar uma casa que não tenha ao menos um aquário. Tanto que não é surpresa termos a quarta maior população total do mundo desses mascotes, segundo a Abinpet. Porém, dos nossos 132 milhões de pets, 2 milhões não se encaixam no que chamamos de “tradicionais”. Afinal, por que não escolher um jabuti ou mesmo uma aranha para criar?

Esses pets diferenciados são cada vez mais comuns nos lares urbanos. Eles vão desde animais silvestres – nativos do nosso país, como o jabuti – a exóticos – trazidos de outras partes do mundo -, como a calopsita e algumas espécies de serpentes. Vinícius de Mello, 18 anos, é dono de uma cobra do milharal, ou corn snake, uma espécie nativa dos EUA. “É diferente, né, não é igual cachorro ou gato, mas é superlegal em alguns aspectos. É tranquilo criar, ela não dá tanto trabalho. Não se alimenta com tanta frequência”, conta Vinícius.

Marcelo S.A., 32 anos, formado em biologia e também professor na área, é dono de uma série desses animais. Três jabutis, cinco cobras do milharal, dois galisés, uma caranguejeira arborícola, um gato e um cachorro. “Eu nunca comprei nenhum. Todos foram de alguém que pegou para criar e com o passar do tempo, cansou, enjoou, ou deu muito trabalho e acabou querendo descartar o animal. E eu os adotei”, explica Marcelo. Todos têm uma história única e por vezes triste. “Cada um está a um tempo diferente comigo. Por exemplo, na semana passada eu recebi um Corn Snake albina. Quando ela estava nascendo, o cara puxou e quebrou a coluna dela em três pedaços. Ele ia descartar o animal, mas acabou ficando comigo, estou cuidando dela agora”, conta.

Como criar esses tipos de animais pode gerar algumas dúvidas. Mas Marcelo e Vinícius concordam que não é muito mais trabalhoso do que criar os tradicionais cães e gatos. “Não tem muita dificuldade. Você precisa reservar um tempo na sua semana para cuidar deles. As serpentes, por exemplo, é uma vez por semana só, você toma o cuidado de limpar o terrário, dar uma alimentação. O jabuti todo dia você dá uma fruta. Você precisa de um lugar adequado para o animal”, orienta Marcelo. Já Vinícius conta de algumas complicações com sua cobra: “O único problema às vezes, é que ela faz muita sujeira quando vai defecar. É um negócio bem nojento. A gente tem até um cálculo de quando e tira do aquário, deixa ela na rua já, pra não ter que limpar”.

A veterinária de animais exóticos e silvestres, Larissa de Amorim, 28 anos, explica que cada espécie exige um cuidado muito específico. “São diversos cuidados dentre manejo sanitário, alimentar e ambiental, sendo bem específico para cada espécie. Mas o ponto mais importante que vejo hoje, que ainda é muito negligenciado, é o cuidado com a alimentação desses animais. Falta muita informação aos donos, então é sempre algo que enfoco muito durante os atendimentos”, destaca Larissa. Quando perguntada se manter animais como esses no ambiente urbano causava algum tipo de estresse, Larissa responde: “Os estresses que ocorrem em cativeiro não são exatamente por estarem em cativeiro, mas sim, por estarem em um de má qualidade e mal adaptado a necessidade ambiental da espécie. O ideal é sempre buscar ajuda de profissionais qualificados e especializados nesses animais para poderem orientar tudo que pode ser feito para promover o bem-estar deles”.

Mas, se eles são diferentes em relação aos cuidados, as histórias que eles rendem são tão boas quanto a de qualquer animal de estimação. Por não serem tão comuns, cobras e aranhas causam um certo estranhamento nas pessoas próximas aos donos. Marcelo conta que ao se mudar para sua residência atual, uma vizinha ligou para todos os outros ao redor, alertando para tomar cuidado com as crianças na rua, porque tinha chegado um homem que criava serpentes. “Foi engraçado isso, primeiro porque é uma serpente que não tem veneno e segundo que dificilmente ela ia ficar na rua com as outras crianças”, relembra.

O contato com outros animais nem sempre pacífico. Vinícius, que também tem um gato, conta que o felino e a cobra não se dão muito bem. “Não posso deixar os dois juntos, porque ia dar problema, certeza. O gato é muito curioso, ele fica parado na frente do aquário encarando ela. Tem vezes que ele sobe em cima do aquário e faz xixi em cima”, revela. Por outro lado, o gato de Marcelo cresceu tão acostumado com as serpentes que quando uma jararaca venenosa entrou em sua casa, nem reagiu. “O gato tava acostumado como se fosse a corn, então ele chegou próximo e teve um episódio bem complicado da serpente tentar atacá-lo”, conta.

Como professor, Marcelo também leva alguns de seus animais para seus alunos interagirem. “É uma oportunidade de ter uma relação diferenciada com a natureza”, diz. Criar animais diferentes pode ser uma experiência interessante, mas antes de adquirir um, é preciso ficar atento às questões de documentação e, ao comprar, garantir que não seja fruto de contrabando.

Foto: Vinicius de Mello