Colecionismo: Paixão por futebol e camisas além da moda

Guardar itens antigos é uma forma de preservar o passado e valorizar a forma como a história foi construída. Já para as pessoas que não enxergam valor sentimental nenhum, os artigos de outras épocas são apenas objetos que perderam a função ao sair de moda. No mundo da moda esportiva, não é diferente. A grande questão é que não se trata apenas de camisas de futebol antigas serem itens raros, elas carregam histórias, representam cidades e transmitem culturas.

O mercado é bem diferente do tradicional. O preço das camisas atuais, que circulam nas linhas de grandes marcas como Nike, Adidas ou Puma, possuem preços tabelados, inclusive de empresas concorrentes. Já falando de camisas de colecionadores, a conversa é completamente diferente, já que muitas vezes os uniformes possuem grande valor emocional e também existem mais fatores a serem analisados em uma negociação. É comum, por exemplo, encontrar pessoas que paguem preço X por um uniforme, enquanto existe outra que estará disposta a pagar quatro vezes mais por considerar a simbologia muito maior.

De fato, não dá para dizer que é uma paixão barata, já que nem com todo dinheiro do mundo você conseguiria “completar” a coleção. O colecionador Salomão Furer Júnior, de 45 anos, possui um acervo com mais de 5.000 camisetas de futebol e as mantém em apartamento que é usado apenas para tal fim. Ele cita um exemplo de como algumas camisetas chegam a ser inegociáveis: “Existe uma regra no Colecionismo: você nunca vai ter tudo que você quiser, tendo todo o dinheiro do mundo dá para comprar o melhor carro do mundo, mas se você quiser o meu ‘Opala 70’ e eu não quiser vender, ele nunca será seu. Então é impossível ter tudo que que queremos”. E completa: “Tenho uma camisa do Maradona que duas pessoas querem muito ela. Mas assim, se eu me desfizer da camisa de jogo do Maradona que forma o par com a camisa do Pelé, vai ficar ficar faltando um pedaço de mim e da minha coleção. Dinheiro vem e vai, mas uma camisa dessas você não encontra”.

Parte do acervo com mais de 5.000 camisas (foto: Salomão Jr)

Assim como toda a sociedade, a comunidade dos colecionadores de camisas de futebol aproximou-se com o avanço das redes sociais e a tarefa de conseguir as camisas mais raras tornou-se menos difícil. Salomão citou também a dificuldade que tinha em colecionar antigamente: “O pessoal da nova geração não imagina a dificuldade que era naquela época no final dos anos 80, início dos anos 90. Hoje com a globalização você consegue a do time que você quiser. Naquela época, lembro de ter telefonado para clubes sugerindo depositar e as pessoas me mandarem. Mas 99% não fazia isso porque os clubes não tinham a mentalidade que tem hoje, atualmente estão preparados para vender online, o máximo que acontecia era de alguém ficar lisonjeado e presentear com a camisa”, explica.

Dessa forma, as páginas no Instagram, blogs ou grupos de Facebook facilitam as trocas, vendas, compras ou apenas debates sobre o tema. Além disso, ajudam na organização de encontros entre os colecionadores, o que é muito comum no meio. O Museu do Futebol, localizado no Pacaembu, é um famoso ponto onde acontecem diversos encontros de colecionadores. Assim, todos que têm esse amor por futebol e camisas em comum, acabam se aproximando por conta da interação através de redes sociais.

O também colecionador Guilherme Costa, de 37 anos, cita as amizades criadas no meio do colecionismo, um ponto fundamental na sua paixão pelas camisas: “Eu nunca cansei do Colecionismo, porque além de conseguir as camisas, o mais legal que você faz são as amizades. Eu tenho muitos amigos nesse meio, pessoas que falo nas redes sociais sem nunca ter visto. Temos conversas frequentes. Um exemplo disso é meu amigo Maurício, de São Paulo, também colecionador. Em um encontro que ocorreu no Museu do Futebol, ele me convidou para ficar na casa dele. As camisas se perdem, se rasgam e as amizades são pra sempre. Você tendo amigos, além da amizade, eles consequentemente te ajudam a conseguir as camisas que você pode querer”.

Guilherme e sua coleção de camisas de seleções (foto: Guilherme Costa)

Guilherme é um exemplo da diversidade de nichos que existem entre os colecionadores. Como é mais difícil adquirir tantas camisas aleatoriamente, é comum que cada um acabe se identificando com regiões, estilos de uniformes, ou características que limitem a coleção. Para ele, a paixão se misturou com geografia e a sua coleção é formada apenas por camisetas de seleções nacionais. São mais de 135 camisas, incluindo alguns exemplos inusitados, como Ilhas Salomão ou Letônia.

O ramo pode parecer um mercado rentável por, às vezes, tratar de valores altos, mas o amor que os envolvidos têm pelas suas camisas vai muito além. São preservadas com todo cuidado, inclusive alguns colecionadores preferem nem utilizá-las. Guilherme, por exemplo, diz vestir cada camisa no máximo duas vezes por ano. Além disso, o cuidado na hora de guardar é fundamental para que a perda não venha a ser tanto física quanto emocional.

Foto de capa: Salomão Jr