Efeito Hitchcock: O grande legado do Mestre do Suspense

Quase quatro décadas após sua morte, o diretor inglês continua sendo referência em diversas produções cinematográficas

O diretor norte-americano Jordan Peele se tornou um verdadeiro divisor de opiniões entre os cinéfilos da internet. Com uma carreira em processo de consolidação e ainda muito recentemente inserido no grupo seleto de promessas hollywoodianas, o diretor de “Corra!” (2017) e “Nós” (2019) foi rapidamente comparado ao atemporal Mestre do Suspense: Alfred Hitchcock.

Poucas pessoas causam tanto impacto na história. Por todo o seu brilhantismo e destaque, Hitchcock se tornou, não um mero nome, mas uma assinatura. “A bem da verdade, é mais fácil apontar quais cineastas não apresentam alguma forma de influência de Hitchcock”, afirma Marcelo Lyra, formado em Jornalismo pela PUC-SP. Professor no Museu da Imagem e do Som e no Espaço Itaú de Cinema de São Paulo, Lyra acredita que o destaque do diretor inglês é reflexo de sua inventividade, o permitindo se renovar constantemente. Um homem à frente do seu tempo, ele não media esforços quando se tratava de ousar, explica.

Não fale, mostre. Esse é o princípio do suspense Hitchcockiano. “É um cineasta muito visual e a força de seu suspense está sempre nas imagens. Os diálogos são usados na construção da situação de suspense, mas na hora da ação, é tudo muito visual, as imagens falam por si”, continua Lyra. O clássico “Psicose” (1960) é um forte exemplo de aplicação da técnica. O clímax está fundamentado na noção do espectador sobre o que vai acontecer, em contraste com o desaviso da personagem. No caso específico desse filme, o rosto do assassino é mantido em segredo até o final e, mesmo visualizando a figura a todo momento, não fica nítido quem de fato está por trás da silhueta.

Quentin Tarantino, por sua vez, ressignifica a noção hitchcockiana de imagem e diálogo. Para Lyra, ele vai além, constrói a ação no visual e quebra o suspense por meio das falas.  “Em Pulp Fiction, Travolta e Samuel Jackson estão indo enfrentar traficantes, mas conversam sobre se massagem no pé é uma coisa sexual ou não, de forma muito interessante”, relembra o professor. Em seguida, ele acrescenta que, por outro lado, o diretor utiliza o mesmo método de construção de personagens facilmente relacionáveis, normalmente bonitos e carismáticos, para, por fim, matá-los, como feito por Hitchcock.

Para o cinema enquanto técnica, o Mestre do Suspense conseguiu muito dos seus efeitos por meio de truques de câmera. Dentre eles, o “Efeito Hitchcock”, também conhecido como Travelling ou Dolly Zoom. Aplicado na obra “Um Corpo que Cai” (1950), o método simula o efeito de vertigem e distorce a cena. A sensação transmitida é de desorientação, com um objeto fixo focado e a movimentação do cenário ao redor. Outro favorito do século passado, “Poltergeist”, de Steven Spielberg, constrói um corredor infinito a partir do truque. Obras como “Psicose”, “Tubarão” e Apollo 13” também fazem o uso do efeito.

No dicionário hitchcockiano, outra palavra importante é o MacGuffin. “É uma coisa que aparentemente é importante, mobiliza toda a história, mas no fundo nem importa o que é. Dezenas de filmes usam essa técnica. A maleta de ‘Pulp Fiction’, que os personagens de Travolta e Samuel Jackson recuperam. Ninguém nem sabe o que tem dentro, mas toda a trama é causada por ela, gira em torno dela. Os planos dos inimigos de super heróis, para dominar ou destruir o mundo, muitas vezes são MacGuffin”, explica Lyra.

Construção de filmes em storyboards, uso de planos sequência, papéis destaques para mulheres e tópicos polêmicos, como adultério, Alfred Hitchcock explorou de tudo e inovou na maneira de produzir as suas obras. Por isso, seu nome está eternizado como um marco na história da sétima arte. Com as gerações, outros nomes virão, e, dessa forma, Francis Ford Coppola, Steven Spielberg, Martin Scorsese, M. Night Shyamalan, e o próprio Jordan Peele, naturalmente apresentarão certa similaridade. “Quase todo ano algum crítico fala sobre esse ou aquele serem novos Hitchcocks. Nunca são, e nem é importante que sejam. Importante é apenas que sejam bons”, conclui Lyra.

Foto: Senses of Cinema